Sete profissionais da cultura comentam a situação do meio artístico na cidade
Neste mês de março, a pandemia do novo coronavírus completa um ano no Brasil. A arte e a cultura são serviços essenciais para o bom desenvolvimento da vida em sociedade. Mas, neste momento atípico, esses âmbitos tiveram suas estruturas abaladas. O confinamento e as práticas de não aglomeração limitaram os movimentos artísticos e fizeram com que os profissionais do ramo buscassem novas alternativas para seguir trabalhando, e, dessa maneira, dar continuidade a ações, captações de recursos e outros processos relativos à área.
O novo “normal”
As novas modalidades de trabalho em modelo remoto demandam uma constante adaptação dos artistas. Crianças em casa o dia todo, familiares e amigos sofrendo com a doença, e a não possibilidade dos encontros presenciais são exemplos de situações que alteram a rotina no âmbito profissional. “Neste longo período, o setor cultural se viu diante da necessidade de se reinventar”, afirma Nina Capel, produtora cultural.
Este é o caso do Teatro da Pedra, companhia de teatro são-joanense. O sentimento de fracasso esteve presente no dia a dia da trupe, que se sentiu imobilizada ao assistir seus planos para 2020 serem adiados. “A gente ia para a Itália, já estava tudo marcado e, dez dias antes da viagem, chega a pandemia e muda aquilo que foi planejado”, relata Juliano Pereira, diretor do grupo.
Enquanto isso, para Lorraine Senna, dançarina e professora no Galpão Arte em Movimento, utilizar as redes sociais para divulgação de trabalhos já era algo habitual antes da quarentena. Mas, diante do cenário apresentado, novas abordagens como a produção de conteúdo semanal foram “dobradas” nesse aspecto, segundo a artista.
O uso das mídias virtuais como novos palcos, embora com adversidades, trouxe a possibilidade de acessar outros espaços. “Consegui participar de festivais e eventos que, com certeza, não teria tido acesso no modo presencial”, conta a atriz e fotógrafa Priscila Nataly. Além disso, a produtora Nina Capel expõe que soluções como transmissões online marcaram vez como formas de garantir a saúde dos profissionais e a acessibilidade do público: “A grande questão é como fazer diferente, de forma a encantar o espectador”.
Políticas públicas e editais fomentam o mercado
O setor cultural está entre os mais afetados pela pandemia de Covid-19, que atingiu diretamente artistas, técnicos, produtores e uma série de prestadores de serviços da cadeia criativa. Impedidos de dar continuidade aos seus projetos, grande parte desses profissionais têm convivido com incertezas, buscando formas autossustentáveis de trabalho, como lives e campanhas de arrecadação. Mas, muitas vezes, só isso não é o suficiente. Portanto, novas maneiras de financiamento e captação de recursos foram procuradas.
Diversos editais voltados para o meio artístico lançados durante o período foram de grande ajuda no processo de estabilidade financeira, como citado pela fotógrafa Priscila Natany: “Tive uma vivência muito rica. Continuo produzindo e tenho a impressão que houve uma democratização maior para artistas de todo o país”.
Para a atriz e performer Lucimélia Romão, a situação foi diferente. Sem os editais, ela não conseguiria se manter durante a pandemia: “Se eu não tivesse me inscrito em editais em 2019, o ano de 2020 teria sido bem difícil. Porque quando a pandemia começou, eu só recebia uma bolsa de R$390,00 da minha universidade”. Situação semelhante a de Camila Mendes, bordadeira, que contou com o auxílio emergencial do governo para se manter: “Foi ele que me ajudou em 2020, porque minha produção é instável e eu não possuo renda fixa”.
Entra em voga uma nova possibilidade: Lei Aldir Blanc
Além dos editais e do auxílio emergencial, outra forma de incentivo foi o subsídio estipulado pela Lei 14.017, 2020 — Lei Aldir Blanc. A nova legislação homenageia o músico de mesmo nome, um dos primeiros artistas mortos em razão do vírus.
Ela é direcionada a dois tipos de beneficiários: pessoas físicas, como profissionais do setor artístico e cultural, e entidades culturais afetadas em suas atividades, como pequenas empresas e instituições culturais. Em São João del-Rei, foi prevista a aplicação de R$635 mil na economia. Dos sete entrevistados, cinco foram contemplados pela Lei.
O produtor musical do Estúdio El Niño, Juliano Pires, encontrou na Aldir Blanc um grande amparo: “Muita gente que antes não teria condições financeiras de produzir o seu próprio disco agora tem o orçamento para isso, e tem nos contatado para as gravações”.
Público x Artista
Espetáculos, aulas presenciais, ensaios e vendas tiveram que ser repensados. Para Camila Mendes, a adaptação veio por meio das ações feitas em outdoors, tapumes de obra por São João del-Rei, janelas e mídias sociais da ADRO Galeria, coletivo do qual faz parte.
Os eventos online são outros artifícios utilizados que demandam uma linguagem própria e plataformas de transmissão eficientes. “Fiz duas gravações do meu trabalho ‘Mil Litros de Preto’, que era presencial. É uma sensação diferente já que, na gravação, são poucos participando. E no espetáculo há uma audiência maior envolvida”, relata Lucimélia Romão.
No Galpão Arte em Movimento, a volta às aulas foi feita com turmas reduzidas pela metade e adotando medidas de segurança, como: uso obrigatório de máscara, tapete com água sanitária para limpeza dos sapatos, aplicação de álcool 70% e a medição de temperatura na entrada. Já Juliano Pereira pensa em formas de promover o retorno presencial, com equipes e público menores dentro do Teatro da Pedra ou ao ar livre. “Estamos constantemente pensando em como fazer isso acontecer. Virtualmente? Presencialmente? De máscara? Com vários metros de distância? Ainda não sabemos. Há várias formas de trabalhar, o importante é ocupar os espaços”, conclui.
Por Alícia Antonioli, Ana Luiza Hansen e Lara Aquino
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