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Foto do escritorFragmentos da Pandemia

Psicopandemias

Os impactos do covid-19 na saúde mental, tratamentos, prevenção e alternativas.


Impactos da pandemia: profissionais relatam experiências.

Nesse mês de março a pandemia do novo coronavírus completa um ano no Brasil, deixando diversas sequelas na sociedade, desde a sobrecarga sobre o Sistema Único de Saúde aos impactos na economia. Após um ano, o país superou a triste marca de 3000 mortes diárias, até o fechamento desta reportagem. O novo pico da doença encontra a população ainda mais fragilizada e exausta. O luto coletivo, os sentimentos de desesperança e o esgotamento devido ao isolamento social estão entre os problemas que se tornaram comuns no país.


Diante deste cenário, o impacto na saúde mental da população pôde ser sentida em números. De acordo com o Google Trends, na semana de 29 de março a 4 de abril de 2020, quando a maioria dos estados brasileiros já havia decretado quarentena, a busca por atendimento psicológico no Google chegou a 88%. O artigo “Depressão e Ansiedade entre trabalhadores essenciais do Brasil e da Espanha durante a Pandemia de Covid-19: uma pesquisa pela Web” (Depression and Anxiety Among Essential Workers From Brazil And Spain During The Covid-19 Pandemic:a websurvey), aceito na revista científica Journal of Medical Internet Research demonstrou que os sintomas de ansiedade e depressão afetam 47,3% dos trabalhadores de serviços essenciais durante a pandemia de Covid-19, no Brasil e na Espanha. Mais da metade deles — e 27,4% do total de entrevistados — sofrem de ansiedade e depressão ao mesmo tempo.


Atendimentos Remotos.


Diante das recomendações de isolamento social, boa parte dos profissionais passaram a realizar seus atendimentos à distância. Em 2020 o Conselho Federal de Psicologia (CFP) registrou, somente entre março e abril, 51.747 novos pedidos para que psicólogos trabalhem virtualmente. A solicitação é necessária, já que desde 2018 o CFP exige a formalização na plataforma e-Psi como forma de fiscalizar os atendimentos remotos, de maneira a garantir sigilo, proteção e confidencialidade.


Em 26 de março, um mês após o surgimento do primeiro caso do coronavírus no Brasil, uma nova resolução do CFP reforçou o cumprimento do Código de Ética Profissional da categoria e o cadastro prévio no e-Psi como prerrogativas para o atendimento de forma remota. Segundo a Psicóloga do SUS Cecylia Moreira da Silva, a plataforma, além de monitorar as atividades profissionais dos psicólogos, “contribui para a construção de um banco de dados, disponível no site do CFP, onde é possível buscar e encontrar profissionais disponíveis para atendimentos nessa modalidade”, afirma.


O profissional que quiser se cadastrar, deve fazer o requerimento online, no site do CFP, a partir de sua inscrição profissional, e preencher as informações solicitadas para análise e posterior autorização do Conselho.


Para a psicóloga Luma Peixoto, a nova modalidade trouxe tanto aspectos positivos como negativos. Se por um lado a terapia online permite que pessoas de outras regiões tenham acesso ao tratamento e possam usufruir do conforto de suas casas, sabe-se que tal realidade não é regra. Problemas com a falta de equipamento, internet de baixa qualidade e a ausência de um espaço de privacidade são algumas das questões que “interferem no vínculo da terapia”, como aponta a psicóloga. A terapeuta também percebeu uma mudança gradual em seus atendimentos, que sofreram uma queda no primeiro semestre de 2020 e depois passaram a aumentar.


Caso seja necessário encaminhamentos posteriores dos pacientes para psiquiatras, a modalidade de atendimento on-line é aprovada pela Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 2.227/18.


O SUS


No SUS, a situação é um pouco diferente. Segundo a psicóloga e responsável técnica pelo Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) I de Três Pontas (MG), Maria Paula Vasconcelos, por lá os atendimentos passaram a ser semipresenciais, mantendo as mesmas ações durante toda a pandemia.


Na visão da terapeuta Cecylia, as buscas por atendimento psicológico aumentaram significativamente. O aumento foi processual, como também comenta Luma, “nos primeiros meses de pandemia, tivemos uma baixa nas demandas, o que acredito se justificar pelo fato de que não se sabia muito sobre o coronavírus, quem podia estava isolado em casa e a orientação era de que se buscasse atendimento somente em caso de maior necessidade. Conforme a pandemia vem acontecendo, as demandas voltaram a subir no segundo semestre do ano passado e assim permanecem”, conta Cecylia.


Os CAPS, são instituições destinadas a acolher pessoas com transtornos mentais, estimular a integração social e familiar e dar apoio aos pacientes em sua busca por autonomia. “O atendimento é ofertado a pessoas em sofrimento mental grave ou persistente e/ou vivenciando problemas decorrentes do uso de álcool e outras drogas”, descreve a psicóloga Maria.

Nos CAPS I de Três Pontas, no início da pandemia, os atendimentos ambulatoriais presenciais foram suspensos, exceto nos casos mais graves, e estiveram em regime de plantão psicológico por telefone. Devido à pouca procura, após um tempo, os atendimentos presenciais foram retomados. “Quanto à permanência-dia (pacientes que passam o dia no CAPS recebendo cuidados intensivos em saúde), houve redução na quantidade de frequentadores e aumento no cuidado domiciliar destes”, explicou a responsável.


O CAPS não trabalha com fila de espera. Todos que buscam o serviço são acolhidos, orientados e direcionados. Os casos graves são necessariamente inseridos em tratamento. Os casos moderados recebem atenção pontual e os leves são encaminhados à atenção primária em saúde, nas Unidades Básicas de Saúde (UBS).


“A saúde pública é direito de todos”, afirma Maria. Para Cecylia, as maiores dificuldades estão relacionadas ao sucateamento dos serviços públicos de saúde. “O que muitos não sabem é que o SUS já nasceu subfinanciado, ou seja, nunca operou com o financiamento adequado para a sua proposta - o que, em parte, justifica aquela fala que a gente sempre escuta de que o SUS é bonito no papel, mas fora dele é cheio de problemas”.


Durante a pandemia o maior desafio encontrado por Cecylia vem sendo a falta de verba e financiamento para que o SUS possa operar bem. Desde 2016 o Sistema de Serviços e Ações vêm sofrendo cortes no financiamento. Em 2016, tivemos a aprovação da "PEC da morte" (PEC 95) dispondo sobre o congelamento dos investimentos públicos com saúde e educação durante duas décadas. “Temos sentido o impacto direto desse congelamento na qualidade do trabalho e da atenção ofertados nos dispositivos públicos de saúde”, pontua Cecylia.


A realidade apontada por ela é que a cada ano que passa o SUS opera com menos recursos “e consequentemente, isso intensifica o desmonte e a qualidade de serviços, equipes e atendimentos”. A psicóloga atuava com uma equipe multidisciplinar composta por dez profissionais que atendem a cinco municípios que somam, em média, 25 mil habitantes. O financiamento que mantém o local não é reajustado desde 2011.


“No fim do ano passado o atual (des)governo propôs desmontar ainda mais os serviços públicos de saúde mental - em meio à pandemia! Por isso digo que as maiores dificuldades estão relacionadas ao subfinanciamento e ao consequente sucateamento/desmonte dos serviços e de nossas políticas públicas de saúde”, conclui a Cecylia.


Terapias alternativas


Terapias alternativas durante a pandemia do novo coronavírus
Terapias alternativas durante a pandemia do novo coronavírus

Segundo Cecylia, falar em “estabilidade emocional” nesse período é um assunto delicado, já que se trata de algo individual. Como recomendação, ela sugere: se envolver em atividades que promovam o bem-estar e o autocuidado, respeitando o que estiver sentindo. “Caso não seja possível fazer isso sozinhe como o jornalismo está lidando com os pronomes neutros, vocês estão acompanhando? ou não se sinta bem e precise de ajuda, buscá-la com alguém que possa auxiliar e dar apoio”.


Pensando no autocuidado, pode-se encontrar serviços terapêuticos disponíveis gratuitamente, como é o caso do Grupo de Meditação guiada. A iniciativa se trata de um projeto da Universidade Federal de São João del-Rei (MG), mediado pela professora e psicóloga Maria Tereza Agrello do Campus Centro-Oeste. Anteriormente, as atividades funcionavam de forma presencial, mas ao longo do período da pandemia passaram a ser desenvolvidas através do Whatsapp.


Os áudios de meditação guiada são postados de segunda a sexta e seguem a linha de mindfulness, proposta por Jon Kabat-Zinn, e a Leitura Corporal, desenvolvida por Nereida Fontes Vilela. A meditação guiada é uma prática que contribui para a saúde física e mental ao promover o relaxamento, atenuando o estresse e a ansiedade. Pode promover também o equilíbrio das emoções, por meio do incentivo a busca pela paz interior e a calma, usando áudios com duração de 3 a 30 minutos. O grupo de meditação presencial, do CCO, existe desde 2017. Entretanto, com a pandemia e o isolamento social, a proposta foi adaptada ao formato remoto desde março de 2020 e 332 pessoas já passaram pelo projeto, nessa nova modalidade.


Pets - um alívio na pandemia


O papel dos animais de estimação como auxiliares da saúde mental humana é reconhecido cientificamente, como por exemplo, o efeito positivo da terapia assistida por animais em desenvolver bem-estar e saúde emocional. Durante o recente surto de Covid-19, a relação que as pessoas têm com seus cães, gatos e outros pets ajuda a compensar a dramática redução em suas interações sociais e físicas com pessoas.


Um estudo recente publicado na revista científica Journal of Veterinary Behaviour sugere que os animais de estimação trazem um benefício para a saúde mental, emocional e física das pessoas. O trabalho foi feito com base em quase 1.300 respostas a uma pesquisa feita durante três semanas de confinamento.


A psicóloga Luma aponta que ter um animal pode contribuir para que o isolamento não seja tão difícil e para manter a noção de vínculo: “Nesse lugar do contato, ter um animal de estimação pode fazer toda diferença porque faz a gente sair um pouco de si e ir pro outro, para o simples, para aquele afeto que é simplificado.” Além disso, o simples fato de o bichinho ter suas necessidades, é um estímulo para uma mudança na rotina: “o levar pra passear pode despertar a dimensão do exercício físico, o dar banho, o se preocupar em manter a área limpa para aquele animalzinho, isso tudo é aspecto relacional e com certeza pode influenciar positivamente na saúde mental”, afirma Luma. A psicóloga conclui que ter um pet neste momento é uma maneira de relação que pode ser fundamental para a estabilidade e para os vínculos.


Segundo dados de um estudo elaborado pela Human Animal Bond Research Institute (HABRI) com 2.000 pessoas com pets, 74% relataram uma melhora na saúde mental em decorrência da relação com seu animal de estimação, e 75% relatam melhora da saúde mental de um amigo ou familiar devido a presença de um pet. A presença de um animal também contribui para a diminuição da sensação de solidão, impacta na autoestima, contribuindo para o aumento da sensação positiva entre outros ao organismo do ser humano. A enfermeira e pesquisadora na área de terapia assistida por animais, Priscila Muralha, comenta que: “O animal consegue trazer uma gama de benefícios, seja diminuição de estresse, de crises de ansiedade, crises de pânico, a gente tem alguns relatos científicos da diminuição até de crises de convulsão e diminuição de pressão arterial.”


Nesse contexto, é possível observar o importante papel dos pets durante a pandemia e os diversos benefícios de ter um em casa. Porém, o momento de euforia pode fazer com que as pessoas esqueçam que é uma vida, que tem suas necessidades e requer cuidados. A decisão de ter um animal de estimação deve ser bem analisada: o tutor deve estar ciente que a atitude envolve custos, muita responsabilidade e eventualmente, alguns chinelos comidos.


E você, como tem cuidado do psicológico?


Ana Luiza Hansen, Lara Aquino e Samara Santos.


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